Produtores rurais evitam despejo de quase 16 mi de litros de esgoto na natureza com uso de tecnologias de saneamento

No sítio Monte Alto, a fossa rudimentar deu lugar à Fossa Séptica Biodigestora, que trata o esgoto sanitário e gera biofertilizante utilizado na propriedade para adubar pés de café.

Pequenos produtores do interior de São Paulo que adotaram sistemas de saneamento básico rural ao longo de quase duas décadas evitaram que 16 milhões de litros de esgoto doméstico e outros efluentes fossem despejados na natureza. Destinadas à agricultura familiar, as propriedades localizadas no município de São Carlos, além de reciclarem todo o material, estão utilizando o biofertilizante gerado pelo sistema de tratamento em lavouras de café e na produção de mudas de árvores destinadas ao reflorestamento.

Os impactos da adoção das tecnologias sociais Fossa Séptica Biodigestora, Jardim Filtrante e Jardim Aquícola, desenvolvidas pela Embrapa Instrumentação (São Carlos – SP) não refletem apenas na preservação do meio ambiente, mas também no bolso dos produtores. Até quem começou a usar a Fossa Séptica Biodigestora há apenas um ano já percebe a diferença que a tecnologia, destinada ao tratamento do esgoto sanitário, traz para o campo.

Além de ter deixado de despejar na natureza cerca de 37 mil litros de esgoto sanitário em 12 meses, ao substituir a fossa rudimentar pela Fossa Séptica Biodigestora, o produtor rural Luís Donizetti Marcatto viu a folhagem de seus pés de café ganhar uma coloração verde mais intensa e galhos repletos de grãos da variedade arábica. A explicação está no uso do biofertilizante gerado pela Fossa Séptica Biodigestora, rico em macro e micronutrientes essenciais para a planta.

“Colhemos cerca de quatro sacas de 48 quilos a mais este ano, aproximadamente 20% superior a safra anterior que foi de 18 sacas do fruto”, calculou Marcatto. Pai e filhos já estão praticamente com 100% do esgoto sanitário tratado no sítio Monte Alto de dois hectares, onde produzem hortaliças, além de café, na periferia de São Carlos. Duas unidades da Fossa Séptica Biodigestora já estão em funcionamento, enquanto a instalação de uma terceira deverá ser concluída em uma semana.

Reúso valioso

O que o produtor Marcatto está constatando em curto prazo, Flávio Marchesin já vem testemunhando há 19 anos, quando resolveu instalar em 2004 a primeira unidade da Fossa Séptica Biodigestora no sítio São João, a cerca de 20 quilômetros de São Carlos. De lá para cá, não só adotou mais uma unidade da tecnologia como também instalou outras.

Para tratar a chamada água cinza – oriunda de banheiros, tanque e pias, o produtor rural construiu no sítio de 14 hectares duas unidades do Jardim Filtrante, um Clorador Embrapa para descontaminação da água e um Jardim Aquícola, destinado ao tratamento da água de tanques de piscicultura. Com 100% tratados, a propriedade já deixou de descartar na natureza mais de 15.880 milhões de litros de esgoto e outros efluentes.

A água tratada que não é reutilizada no sistema produtivo local, é descartada no solo, sem impactar o meio ambiente, principalmente o Ribeirão Feijão que margeia o sítio. O rio é responsável por 30% do abastecimento de água de São Carlos. “Mostramos que é possível consorciar produção agrícola de frutas, hortaliças e de peixes com a preservação do meio ambiente. Não impactamos o solo e nem o lençol freático. Assim, também não causamos danos à saúde humana”, diz o produtor rural que mantém uma área de três hectares de floresta na propriedade.

Capacitação gratuita

Desenvolvidas dentro dos critérios de sustentabilidade, baixo custo, fácil aplicação e replicabilidade, as tecnologias instaladas nos sítios Monte Alto e São João são abordadas no curso virtual e gratuito de “Saneamento básico rural”, lançado no dia 15 de março pela Plataforma e-Campo da Embrapa. Em 20 dias, a capacitação que ensina a montar e instalar as tecnologias já recebeu mais de 2.500 inscrições de diferentes regiões do Brasil, de países da América Latina, África e Europa. Clique aqui para se inscrever.

“O curso tem o objetivo de capacitar e formar agentes multiplicadores em tecnologias do saneamento básico rural, para que mais pessoas tenham a oportunidade de conhecer, adotar e se beneficiar dos sistemas em suas propriedades como fizeram as famílias Marchesin e Marcatto”, diz o coordenador e um dos instrutores do curso, o pesquisador da Embrapa Instrumentação, Wilson Tadeu Lopes da Silva.

A capacitação foi pensada de modo a fornecer material didático de fácil compreensão, com viodeoaulas de curta duração, entre 15 e 20 minutos, e com diversos recursos gráficos para facilitar a visualização e o aprendizado.

Ao final de cada módulo, o inscrito terá acesso a um arquivo com material compactado da aula, bem como exercícios de fixação do conteúdo. Ao concluir o curso, que está estruturado em rês módulos com carga total de 20 horas, os participantes receberão automaticamente um certificado de participação.

Além de Wilson Tadeu, as videoaulas serão apresentadas pelo analista e engenheiro civil da Embrapa Instrumentação, Carlos Renato Marmo, e palestrantes convidados de instituições como a Universidade de Campinas (Unicamp), Universidade de São Paulo (USP), ONGs e de prefeituras municipais.

Rumo à universalização

A Embrapa Instrumentação atua desde 2001 com tecnologias sociais destinadas à promoção do saneamento básico em áreas rurais, periurbanas e comunidades isoladas. Com cerca de 12 mil unidades instaladas no país, em mais de 250 municípios brasileiros, a Fossa Séptica Biodigestora se adaptou a diferentes realidades e gerou benefícios para 57 mil pessoas no país. O sistema de saneamento básico rural proposto pela Embrapa está em sintonia com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 6 – Água e Saneamento – e suas 8 metas.

Dos cerca de 39 milhões de habitantes que moram no campo, apenas 20,5 % têm acesso a serviços adequados de coleta e tratamento de esgoto, de acordo com dados do Programa Nacional de Saneamento Rural (PNSR, 2019).

Portanto, cerca de 31,5 milhões de brasileiros ainda sofrem com o problema crônico e grave da falta de coleta e tratamento de esgoto. Segundo o Instituto Trata Brasil (ITB, 2019), existem quase 5 milhões de brasileiros que não possuem banheiro, ou seja, defecam ao ar livre.

Os dados mostram o tamanho do desafio e a necessidade de ações visando a universalização do saneamento, conforme preconiza o Marco Legal do Saneamento Básico (Lei 14.026/2020), ter 99% da população com água potável e 90% com coleta e tratamento de esgoto até 2033. Foto: Joana Silva

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