Moïse Kabamgabe: MPT processa quiosques Tropicália e Biruta por trabalho escravo

Ação também pede pagamento de verbas trabalhistas, pensão à família da vítima e danos morais individuais e coletivos

O Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ) entrou na Justiça Trabalhista contra o Quiosque Tropicália e o Quiosque Biruta por considerar que o congolês Moïse Kabamgabe e outros trabalhadores foram submetidos a condições análogas a de escravidão.

A investigação comprovou que os garçons dos quiosques réus trabalhavam de 10 a 12 horas por dia, sem fornecimento adequado de água e alimentação, com restrição de acesso ao banheiro e sem equipamentos de proteção individuais básicos, como óculos de sol, protetor solar, boné e camiseta com proteção UV, expondo os trabalhadores à imunodepressão e, consequentemente, ao risco de câncer de pele.

Além disso, nenhum deles possuía a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) registrada, sendo pago, conforme declaração dos próprios sócios, apenas a diária do trabalho, que variava (podendo chegar a zero) de acordo com o movimento da praia e com as vendas do dia.

O MPT pede a responsabilização dos sócios dos quiosques, da Orla Rio – concessionária responsável pela fiscalização dos estabelecimentos na orla do

Rio de Janeiro – e da prefeitura do Rio de Janeiro. Segundo os procuradores, estes dois últimos foram omissos em fiscalizar as condutas dos quiosques. Após a morte de Moïse Kabamgabe, auditores-fiscais do Trabalho verificaram as condições de trabalho em outros quiosques situados na praia do Leme ao Pontal e identificaram que, pelo menos 256 empregados trabalhavam sem registro, entre eles, muitos imigrantes e refugiados.

Para a procuradora Guadalupe Louro Couto, as condições subumanas de trabalho foram demonstradas ao longo da investigação e nas provas apresentadas pelo MPT. “Condições, essas, agravadas pelo fato de o Moïse ser um trabalhador negro e imigrante, cujas possibilidades de ser inserido no mercado de trabalho são mais difíceis. Não há, portanto, como negar a coação moral sofrida pela vítima para continuar nessa relação de trabalho de exploração subumana, a fim de garantir a sua subsistência e a de seus familiares no Brasil”, explica.

A ação cobra que seja declarado o vínculo empregatício de Moïse Mugenyi Kabamgabe, na função de garçom, no período de 1º de dezembro de 2018 a 22 de janeiro de 2022, sendo paga à família do congolês um total de R$ 254.643,80, referente às verbas trabalhistas do período, considerando o salário-mínimo previsto da categoria, além de férias, FGTS, 13º, horas extras, saldo salário e aviso prévio.

O MPT pede, também, que todos os réus paguem, até o julgamento final da ação, um salário-mínimo à Lotsove Lolo Lay Ivone, mãe de Moïse, a fim de garantir que seus familiares possam ter renda mínima para suas necessidades básicas e, considerando que o falecimento de Moïse agravou a já extrema vulnerabilidade da família. Em caráter definitivo, os procuradores requereram o pagamento de pensão no valor de R$ 3,755 milhões de pensão, equivalente a 2/3 do salário do trabalhador e considerando uma expectativa de vida de 76 anos.

Também cobram dano moral individual no valor de R$ 2 milhões e dano moral coletivo de R$ 11,5 milhões pelas condições laborais degradantes encontradas nos quiosques da Orla do Rio de Janeiro. O primeiro montante deve ser destinado à família de Kabamgabe, enquanto o último deve ser encaminhado à entidade social sem fins lucrativos, como forma de reparar os danos causados à coletividade.

Segundo a procuradora Lys Sobral Cardoso, “trata-se de caso clássico de trabalho em condições análogas às de escravo no meio urbano. Os quiosques-Réus, aproveitando-se das vulnerabilidades dos trabalhadores, principalmente dos imigrantes, do desemprego que assola o país, os transporta da precariedade para a subumanidade ao submetê-los a condições degradantes de trabalho, a jornadas exaustivas, com ausência de intervalos intrajornadas, de descansos semanais, com baixa remuneração, sob calor excessivo, sem Equipamentos de Proteção, sem sanitário disponível e locais de repouso, conforme demonstrado no item dos fatos”.

Além dos valores a título de dano moral individual, coletivo e verbas trabalhistas devidas ao congolês Moïse Kabamgabe, a ação do MPT cobra o imediato cumprimento da legislação trabalhista pelos Quiosques Tropicália e Biruta, com o devido registro na CTPS de todos os empregados, o respeito à jornada diária de no máximo 8 horas, a garantia de livre acesso aos sanitários, o fornecimento de EPIs, de alimentação e água, além do pagamento das demais verbas trabalhistas.

Assinam a ação civil pública pelo MPT as procuradoras Guadalupe Louro Couto, Juliane Mombelli e Lys Sobral Cardoso e os procuradores João Batista Berthier e Italvar Medina.

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