‘Isso não é gente’: os áudios com ataques a indígenas na pandemia que se tornaram alvos do MPF

Áudios e mensagens de texto com ataques a indígenas do município de General Carneiro, no interior de Mato Grosso, se tornaram alvos do Ministério Público Federal (MPF). Os comentários ofensivos foram compartilhados nas últimas semanas em um grupo de WhatsApp destinado aos moradores da cidade.

Nos áudios e nas mensagens de texto, os indígenas são apontados por alguns moradores como os principais responsáveis por propagar a covid-19 no município mato-grossense.

Os comentários ofensivos começaram, principalmente, após os moradores notarem que a maioria dos casos de covid-19 na cidade, até o momento, tinham sido registrados nas aldeias da região.

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“Ô, companheiro, isso daí só é índio, rapaz… não é gente, não (…). Dentro de General mesmo, o número de infectados é muito pouquinho, graças a Deus. Agora os índios… esse povo aí é sem cultura, sem religião, quem dá conta desse povo aí?”, disse um homem em um dos áudios compartilhados no grupo.

A cidade mato-grossense tem 5,5 mil habitantes, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Parte da população é composta por indígenas pertencentes aos povos bororo e xavante.

Dados atuais da covid-19 no município apontam que General Carneiro registrou 160 casos de covid-19, sendo 117 deles em indígenas. Na cidade, sete pessoas morreram em decorrência do novo coronavírus, seis delas eram indígenas — três da etnia xavante e três da bororo.

As mensagens no grupo da cidade no WhatsApp causaram apreensão em indígenas, que passaram a temer que as acusações contra eles motivassem ataques às aldeias. Em razão disso, encaminharam o caso ao MPF e irão levá-lo para a Fundação Nacional dos Índios (Funai).

No grupo, intitulado “General Notícias Regiões”, alguns moradores utilizaram termos ofensivos ao se referir aos indígenas. “Palhaçada esse tanto de casos positivos (de covid-19) em General. Estou vendo que essa ‘porra’ desse lugar vai fechar por causa desses índios (…). Não estou aguentando esses capetas desses índios na porta de casa pedindo comida 24 horas”, disse uma moradora do município.

A mulher ainda defendeu, no áudio, que os indígenas sejam “trancados” nas aldeias para que não tenham contato com os demais moradores da cidade.

Em outro áudio, um homem chamou os indígenas da região de “bichos” e disse que eles precisam ser isolados, para proteger os outros moradores. “Tem que fechar as aldeias, né? Chegar lá, colocar a polícia lá e travar tudo. Teriam que fechar as aldeias para esses ‘bichos'”, afirmou.

Essas foram algumas das ofensas propagadas no grupo. A reportagem apurou que foram, ao menos, cinco áudios ofensivos nas últimas semanas, além de diversas mensagens de texto.

As ofensas preocuparam os indígenas da cidade. Os bororo, que vivem na Terra Meruri, consideraram as declarações como “violência moral, psíquica, ética e cultural” e afirmaram que a situação representa um caso de “preconceito, injúria racial e racismo”.

Eles classificaram os áudios como “extremamente preocupantes e com teor criminoso, inadmissível em nossa sociedade e no regime jurídico brasileiro”. Em documento assinado por lideranças da região, relatam que os ataques ocorrem desde junho, “por conta do perambulo e permanência na cidade, onde os moradores estão atribuindo a disseminação da pandemia ao trânsito de indígenas”. (BBC NEWS)

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