Não teve para quem quis: vagas para Enem Digital na Bahia são preenchidas em 24h

As 3 mil vagas da modalidade digital do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) disponíveis para a Bahia foram preenchidas já no primeiro dia de inscrição do exame, na segunda, 11/5. Esse será o primeiro ano da versão online da avaliação. Salvador e Feira de Santana são as únicas cidades baianas que terão essa novidade.

O Ministério da Educação (MEC) informou que as inscrições para fazer o exame vão até o dia 22 de maio, e que 1,5 milhão de candidatos já se inscreveram. O cartão de confirmação da inscrição, com o local de prova, será entregue aos estudantes em outubro. Já as avaliações serão aplicadas em novembro e os resultados individuais estarão disponíveis em janeiro.

Pela primeira vez, 100 mil candidatos vão responder as questões pelo computador. Essa modalidade tem a mesma estrutura logística do modelo impresso. As provas irão ocorrer em postos aplicadores credenciados nas cidades definidas pelo edital e as máquinas serão disponibilizadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Na Bahia, apenas as cidades de Salvador e Feira de Santana vão oferecer Enem Digital. São 2,5 mil vagas na capital e 500 na Princesa do Sertão, mas todas já foram preenchidas. Segundo o MEC, até às 10h desta terça-feira (12), quase 93 mil pessoas tinham escolhido a modalidade online do Enem e as vagas acabaram primeiro em localidades do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Além da Bahia, não há mais vagas nos estados de Alagoas, Amazonas, Ceará, Goiás, Maranhão, e Pará.

A estudante Juliana Oliveira, 18 anos, ficou chateada ao saber que perdeu a oportunidade de responder a prova digital. “Eu queria fazer para ver com é e também porque fico mais a vontade respondendo aos simulados no computador do que no papel. O Enem é uma prova muito cansativa, são horas e horas debruçada sobre a carteira, e ano passado fiquei com dor nas costas. Pena que não me inscrevi logo”, lamentou.

Todas as 27 capitais do país vão oferecer o Enem Digital. São Paulo tem a maior quantidade, com 15 mil exames desse tipo, e Boa Vista (RR) a menor, com apenas 50 provas. No Nordeste, a Bahia tem o mesmo número de Pernambuco, 3 mil vagas. O estado mais contemplado foi a Paraíba com 3,7 mil, sendo seguida por Ceará (3,3 mil), Rio Grande do Norte (2,3 mil), Alagoas (2 mil), Maranhão (1,5 mil), Piauí (1,5 mil), e Sergipe (1 mil).

Enquanto Juliana pretende fazer a inscrição no Enem até o próximo final de semana, outros candidatos foram mais ligeiros. Em 2020, o número de inscritos para as duas modalidades no primeiro dia foi maior do que no ano passado. O Inep registrou um total de 1.548.671 inscrições às 10 horas de terça-feira, sendo 1.455.736 para a versão impressa. No ano passado, o sistema tinha 1,3 milhão de candidatos até o final do primeiro dia.

A decisão do MEC de manter as datas do Enem para novembro deste ano tem gerado polêmica. Nesta terça-feira, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado da Bahia (APLB) ingressou com uma ação civil pública no Tribunal Regional Federal (TRT) pedindo que seja suspenso o calendário do Exame. O coordenador-geral da entidade, Rui Oliveira, disse que a pandemia do novo coronavírus ampliou a desigualdade entre os candidatos.

“Não podemos tratar de forma igual quem é desigual. Não dá para em tempos de pandemia, quando os colégios particulares de excelência estão tendo aulas normais remotas, aulas, não atividades, aulas para se preparar para o Enem, enquanto 70% dos 55 milhões de estudantes brasileiros não tem acesso a nenhum tipo de recurso. Como podemos tratar de forma igual quem é tão desigual? Nessa perspectiva é que entramos com uma ação civil pública, pedido a suspensão da data das provas”, afirmou.

Rui também é membro da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e disse que a entidade também entrou com um pedido de prorrogação das datas das provas. As entidades aguardam a resposta da justiça.

Na Bahia, as aulas na rede pública estão suspensas desde março. A medida foi tomada para frear o avanço da contaminação do novo coronavírus. Os estudantes estão sem aulas e atividades desde então.

Em abril, uma decisão judicial em São Paulo determinou a suspensão do Enem, mas o Ministério da Educação recorreu. O MEC alterou a data das provas digitais de outubro para novembro, mesmo mês em que vão acontecer as avaliações impressas, mas não pretende suspender o exame. A Defensoria Pública da União (DPU), partidos políticos e entidades de classe também estão pedindo que a data das provas seja alterada.

Adiamento

A abertura das inscrições do Enem retomou a discussão sobre as implicações da realização do exame em meio ao cenário de pandemia. Confira entrevista com Ademar Celedônio, diretor de Ensino e de Inovações Educacionais do SAS Plataforma de Educação:

CORREIO: Quais são as implicações da manutenção do Enem em novembro?

Desde a terceira semana de março, a gente tem a maioria das escolas fechadas no Brasil, entre públicas e privadas. As escolas particulares, de alguma maneira, na sua maioria conseguiram minimizar esse impacto através de atividades remotas, videoaulas e outros projetos de tecnologia. Já as escolas públicas algumas delas decretaram férias, alguns estados decretaram férias para ter tempo de se organizar e inclusive algumas estão voltando agora. Outros estados não conseguiram. Houve um prejuízo na continuidade dos estudos em pelo menos 20 dias e ainda hoje algumas redes de ensino de alguns estados não estão conseguindo ainda desenvolver 100% das atividades remotas. A gente tem exemplos muito bons, como o do estado da Amazônia, que já tinha um centro muito bem desenvolvido de distribuição de aulas. Virou um dos cases do Brasil. Mas a gente tem estados da federação que ainda não conseguiram. Então, na medida em que esses jovens estão sem o mínimo básico, que é o que tinha antes no ensino presencial, há uma tendência de, quando voltarem, a gente não conseguir fazer com que eles revisem os conteúdos até o exame.

Há uma expectativa, inclusive, olhando para organismos internacionais, de que a volta das aulas deverá ser de forma parcial, então provavelmente a gente não vai ter a turma toda voltando, serão rodízios. Isso mostra que mesmo voltando presencial, a gente vai ter um ano difícil para se completar o conteúdo programático. O que se está pedindo é um alargamento das datas para tentar diminuir o prejuízo em que o aluno vai ter sem essas atividades. É claro que quando voltar as redes podem colocar uma aula a mais por dia, usar sábados e feriados para minimizar o impacto, mas a gente já tem nove semanas com as atividades letivas no Brasil paradas, com expectativa de irmos para 14 ou 15 semanas sem aulas. É muita coisa, é um vácuo. Sem falar que o ano de preparação já é um ano diferente, com muitas tensões.

A Medida Provisória 934 determinou que não precisa ter 200 dias de aula em 2020, só precisa cumprir 800h letivas. Para a educação básica é uma boa ideia, mas para quem está no 3º ano do ensino médio é quase inócua porque precisa cumprir um cronograma. Quando o aluno está na 7ª série, ele consegue repor o conteúdo que não viu nas séries seguintes. Quando se tem 15 semanas sem aulas, se a gente multiplicar por cinco dias letivos são 75 dias, multiplicando por quatro aulas que a pessoa está deixando de assistir, são 300 aulas sem ver nesse período. É um prejuízo significativo e, se prova fosse um pouco mais à frente, poderia minimizar e daria mais conforto.

Alguns alunos que têm acesso a internet conseguem, de fato, aprender nesse momento. Mas alguns alunos não porque a rotina do presencial, do calor do professor, dos colegas, do aprender em colaboração, não é a mesma coisa da forma remota. Então são experiências diferentes e provavelmente pode ter desigualdades nesse processo. Tem desigualdades tanto do ponto de vista sócio-econômico porque eu tenho comunidades que conseguem neste momento estudar porque têm condições financeiras e recursos tecnológicos suficientes, e temos a outra ponta, que são alunos que não conseguem estudar porque não têm o acesso à infraestrutura básica de internet — seja banda larga, seja um dispositivo, um computador ou smartphone com capacidade. Como todo mundo está em casa, estamos descobrindo que a internet está sobrecarregada. Então a gente imagina que mesmo quem tem acesso a um 4g tá com dificuldade hoje porque não está sendo tão rápido quanto nos dias comuns.

Quais informações sobre os estudantes brasileiros indicam que um adiamento seria mais prudente?

Uma coisa que acho que pouca gente está mencionando é que dentro do Enem temos categorias diferentes. Há vagas de cotas e ampla concorrência, que normalmente são os alunos de escola privada que se inscrevem. Os alunos de escola privada eles representam 15% desse universo e escolas públicas são 85%. Então, eu tenho dentro da escola privada camadas sociais A, B, C e D. Alunos de camadas A e B têm mais condições, estudam em melhores escolas, têm mais acesso à internet, aparelhos melhores. Dentro da rede pública tem estados que são muito bons tecnicamente e tem estados que não estão conseguindo ainda levar as aulas. Dentro desses dois nichos de concorrência ainda pode se gerar uma desigualdade se a prova for aplicada em novembro. Os alunos de camadas que estão mais adaptados e com acesso à internet vão conseguir provavelmente melhor êxito na prova. Você tem recortes diferentes onde se pode aumentar a desigualdade dentro dos próprios grupos. O aluno da classe A e B pode ter, além do seu professor que está dando aula pela escola, comprar outros cursos online e outras atividades que complementam o seu estudo. (Correio*)

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