Violência contra as mulheres nas ruas cai durante a pandemia, mas aumenta dentro de casa

A quantidade de mulheres vítimas de violência no último ano, durante a pandemia, pode ter sido reduzida levemente em comparação com os anos de 2017 e 2019, mas o perfil da violência mudou: a queda foi puxada por uma diminuição da violência nas ruas. Por outro lado, a vitimização dessas mulheres dentro de casa aumentou.

Uma audiência pública promovida nesta sexta-feira (20) pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher discutiu os resultados da pesquisa “Visível e Invisível: A Vitimização de Mulheres no Brasil”, encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública junto ao Instituto Datafolha e com apoio da empresa Uber.

De acordo com o estudo, 24,4% das mulheres acima de 16 anos (uma em cada quatro), afirmam ter sofrido algum tipo de violência ou agressão nos últimos 12 meses, durante a pandemia de Covid-19. Isso significa dizer que cerca de 17 milhões de mulheres sofreram violência física, psicológica ou sexual no último ano.

Ainda segundo o estudo, 61,8% das mulheres que sofreram violência no último ano afirmaram que a renda familiar diminuiu neste período. Entre as que não sofreram violência este percentual foi de 50%. Além disso, 46,7% das mulheres que sofreram violência também perderam o emprego. A média entre as que não sofreram violência foi de 29,5%.

A falta de emprego e de recursos financeiros foi apontada por participantes da audiência como um dos fatores para que a mulher não conseguisse escapar do ciclo de violência.

O relatório também aponta que 4,3 milhões de mulheres (6,3%) foram agredidas fisicamente com tapas, socos ou chutes. Ou seja, a cada minuto, 8 mulheres apanharam no Brasil durante a pandemia do novo coronavírus.

Tipos de violência
O tipo de violência mais frequentemente relatado foi a ofensa verbal, como insultos e xingamentos. Cerca de 13 milhões de brasileiras (18,6%) experimentaram esse tipo de violência; 5,9 milhões de mulheres (8,5%) relataram ter sofrido ameaças de violência física como tapas, empurrões ou chutes; cerca de 3,7 milhões de brasileiras (5,4%) sofreram ofensas sexuais ou tentativas forçadas de manter relações sexuais; 2,1 milhões de mulheres (3,1%) sofreram ameaças com faca ou arma de fogo; 1,6 milhão de mulheres foram espancadas ou sofreram tentativa de estrangulamento (2,4%).

A pesquisa mostra que 44,9% das mulheres não fizeram nada em relação à agressão mais grave sofrida; 21,6% delas procuraram ajuda da família, 12,8% procuraram ajuda dos amigos e 8,2% procuraram a igreja. Apenas 11,8% denunciaram em uma delegacia da mulher, 7,5% denunciaram em uma delegacia comum, 7,1% das mulheres procuraram a Polícia Militar (Ligue 190), e 2,1% ligaram para a Central de Atendimento à Mulher, o Ligue 180.

A pesquisa foi feita com um total de 2.079 entrevistas, sendo 1.089 mulheres, 879 das quais aceitaram responder o módulo de autopreenchimento específico sobre vitimização. A margem de erro é de dois pontos para mais ou para menos. A margem de erro para o total da amostra de mulheres participantes do autopreenchimento é de três pontos para mais ou para menos.

Novo perfil
Com relação às duas pesquisas anteriores, de 2019 e 2017, houve uma queda, dentro da margem de erro, no percentual de mulheres agredidas: 24,4% em 2021 contra 27,4% em 2019, e 29% em 2017. Mas, conforme explica Samira Bueno Nunes, diretora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o perfil da violência mudou bastante.

“Esse recuo se dá em relação às mulheres que sofrem violências na rua. Na pesquisa de 2017, 39% das mulheres tinham sofrido violência na rua, e esse percentual foi de 39 pra 19%. Em compensação, a violência dentro de casa passa de 43 pra 49%. 7 em cada 10 casos os autores eram conhecidos, a maior parte parceiros ou ex-parceiros íntimos”, observou.

Ainda segundo Samira, nas duas pesquisas anteriores, o terceiro lugar sempre aparecia como um vizinho ou um amigo. “Agora, na sequência, a gente tem pai e mãe, padrasto e madrasta, filho e filha e irmão e irmã como os principais autores de violência.”

Orçamento
A coordenadora de Pesquisa e Impacto do Instituto Avon, Beatriz Accioly, cobrou investimentos públicos no combate à violência contra a mulher.

“O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos ocupou, apenas, 0,03% das prioridades orçamentárias da União em 2020”, disse Beatriz. Ainda segundo ela, o mesmo Ministério da Mulher gastou apenas 53% do orçamento aprovado para 2020. “Isso é importante, porque lugar de prioridade, para além do discurso, é também o Orçamento”, observou.

A deputada Erika Kokay (PT-DF), uma das deputadas que propuseram o debate, disse que pediu ao Tribunal de Contas da União (TCU) que verifique os recursos gastos no setor. Segundo ela, os recursos orçamentários para a Casa da Mulher Brasileira, por exemplo, foi praticamente zero em 2019.

“O Orçamento, em verdade, tem sido bastante restrito, como se o enfrentamento da violência contra as mulheres fosse algo que pudesse ser preterido e não fosse estruturante”, disse a deputada.

O debate fez parte da programação do Agosto Lilás, promovido pela Secretaria da Mulher, com o objetivo de discutir temas relacionados ao enfrentamento da violência contra as mulheres em suas diversas formas.(Agência Câmara de Notícias)

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