Corra pro Abraço muda vidas de pessoas em situação de rua

De morador de rua e usuário de crack a pré-universitário. O acolhimento transformou a vida de Alan Silva Teixeira, 35 anos, que está deixando para trás as drogas e a rotina incerta depois de conhecer as oficinas de arte-educação do programa Corra pro Abraço. A iniciativa da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SJDHDS) representa o início da escalada para ele sair do fundo do poço.

Desde março, Alan sobe os degraus do curso pré-vestibular do Instituto Cultural Steve Biko, localizado no Pelourinho. Além disso, decidiu voltar para a casa da família. “O povo lá de casa viu que eu não estava mais jogado na droga, como era antigamente”, afirma.

Segundo Alan, o programa possibilitou uma perspectiva para o futuro – algo até então inexistente. “O pessoal do Corra me incentivou e fez minha inscrição no pré-vestibular. Agora, eu já estou com uma perspectiva de fazer um ensino superior porque o programa me deu esse impulso. Muitas áreas me interessam, como geografia, química e matemática, mas psicologia é a que mais me chama a atenção. Eu acho que posso ajudar muitas pessoas”.

Na capital, as oficinas do programa são realizadas no Largo dos Mares, na Praça das Mãos, no Aquidabã e na Baixa do Fiscal. Elas incluem orientações sobre como reduzir os danos do abuso de entorpecentes, evitar doenças sexualmente transmissíveis e a gravidez indesejada, além de como obter documentos e solicitar exames de saúde.

Oficinas de teatro e brincadeiras também fazem parte do programa. A descontração apresenta aos moradores de rua e aos usuários de álcool e drogas um mundo diferente daquele que eles vivem a maior parte do dia.

Abordagem qualificada

O Corra pro Abraço foi criado em 2013, em Salvador, com oito funcionários. Hoje são cerca de 80 colaboradores atuando em parceria com o programa Pacto pela Vida também em Lauro de Freitas e Feira de Santana. As equipes multidisciplinares possuem assistentes e cientistas sociais, psicólogos, pedagogos, arte-educadores e outros profissionais.

A superintendente de Políticas sobre Drogas da SJDHDS, Denise Tourinho, destaca que o público do programa é formado por pessoas de difícil acesso. “O programa nasceu da vontade de fazer algo que tenha caráter ético, não desrespeite a dignidade e a individualidade dos beneficiários, seja tecnicamente sustentável, tenha condições de efetividade maior e seja passível de verificação”.

De acordo com a superintendente, o Corra – que teve como origem um projeto piloto desenvolvido em três anos de trabalho – possui dois objetivos principais. “Um é possibilitar a construção de uma forma de abordagem dessa população, que é arredia ao tratamento e ao acesso devido ao passado de tentativas de insucesso desses indivíduos. Outro objetivo é fazer a mediação entre o indivíduo e as redes, os sistemas de justiça, saúde, educação e de assistência social, garantindo os direitos desses cidadãos em todas as frentes de cidadania”.

Mudança de realidade

Ex-moradora em situação de rua, Rea Silva, 30, vive agora com a filha, em uma casa no bairro de São Caetano. Ela participa das oficinas de teatro e canto na sede do Corra pro Abraço, em Nazaré, e comemora por não se enquadrar mais na descrição de moradora de rua. “Eu estava lá no Pela Porco, usando muita droga e soube que tinha um trabalho para moradores de rua que queriam mudar um pouco a vida. Foi a partir daí que eu conheci o Corra pro Abraço, fazendo curso de redução de danos. Com o tempo, determinei que não queria mais usar drogas e resolvi fazer teatro, esporte e música”.

Rea guarda lembranças duras de um passado recente, mas vislumbra boas expectativas. “As pessoas me chamavam de sacizeira, falavam que eu não tinha nada para oferecer. Quero estudar, mostrar para meu filho a diferença. Vou mostrar a muitos que nós temos dignidade. Tem gente que acha que a gente não tem como mudar, mas nós temos”.

Segundo a coordenadora do Corra pro Abraço, Jamile Carvalho, o programa está sendo ampliado, em parceria com o Pacto pela Vida, com foco na prevenção, para que pessoas de bairros periféricos não acabem em situação de rua ou entrem para a criminalidade. “A gente encaminha os nossos usuários para a rede de educação porque a gente acredita que a reinserção passa também pela escolarização. A oportunidade é o que mais o programa tem oferecido”.

Jamile acrescenta que a iniciativa “ouve as pessoas, identifica a demanda e o desejo delas e oferece um leque de possibilidades para que elas possam ter uma vida produtiva como qualquer outra pessoa na sociedade. A oportunidade muda a vida das pessoas e é isso que a gente tem tentado oferecer para elas todos os dias”.

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